Não faz sentido debater as estratégias para o futuro do audiovisual sem referir a televisão. A “caixa que mudou o mundo” continua a surpreender, com a sua capacidade de evolução, adaptação em diferentes dimensões e continuidade na inovação, mantendo-se nos dias de hoje como um meio relevante para o consumo de conteúdos para todas as gerações.

A presença da televisão continua a ser penetrante e reformulou a própria estrutura das nossas vidas. Mantém-se, pois, a sua missão de mudança, num meio que é quase centenário, acompanhando a evolução da sociedade, dos novos hábitos e comportamentos de consumo. Cada vez mais crítico e exigente, mas também permeável e ávido em receber novas experiências e storytelling de qualidade, o consumidor atual continua a olhar para a televisão como a janela para um novo mundo. Não é por isso, estranho, que o consumo de TV continue a ser relevante e até a aumentar em Portugal, com um tempo de consumo 90 minutos superior ao da média europeia, com cada português a ver em média 5 horas e 21 minutos de televisão em 2022.

Ao longo dos tempos, a televisão tem conseguido realmente adaptar-se e continua a ser uma fonte de agregação social que impacta também a geração mais jovem, que cresceu a consumir outro tipo de conteúdos, sobretudo digitais, com a smart TV a ganhar espaço no centro do entretenimento familiar. A televisão não só repensou o nosso sentido do mundo, como continua a ser na era da internet, das plataformas sociais e da inteligência artificial, o mais poderoso gerador das nossas memórias coletivas, o espelho mais sedutor e simultaneamente chocante da sociedade e a mais poderosa incubadora de tendências sociais.

Toda a indústria do audiovisual está em transformação. O atual mercado de TV e vídeo é altamente dinâmico e caracteriza-se por um grande número de drivers: digitalização, novas ofertas de mercado e disrupção por players digitais que garantem mudanças rápidas. Além disso, as expectativas do consumidor e os hábitos de consumo estão a mudar rapidamente nesta era do vídeo on demand e do consumo de media através das plataformas digitais. As mudanças são visíveis nos serviços de streaming que deixaram de ser apenas plataformas para o consumo de filmes e programas de TV e estão a investir na produção e licenciamento de conteúdo próprio de sucesso global, ou seja, em concorrência direta com a indústria tradicional de TV. Ao mesmo tempo, o comportamento do consumidor mudou radicalmente, e este espera cada vez mais conteúdos de TV e vídeo relevantes e atrativos a que possa aceder a qualquer hora, em qualquer lugar e no formato que melhor se adapte às suas necessidades mais imediatas. Além disso, as empresas de media estão a lançar as suas próprias ofertas on demand e os produtores globais de conteúdo estão a estabelecer os seus próprios serviços de streaming. Ao longo da próxima década, espera-se que o cenário da TV evolua para um modelo híbrido, combinando experiências de audiência linear e on demand. As plataformas que podem efetivamente agregar conteúdo e entregar experiências únicas serão as que terão provavelmente mais sucesso. As tecnologias alimentadas por IA desempenharão um papel maior na criação, distribuição, personalização e medição das audiências.

Sem pretender fazer previsões sobre os cenários futuros para a indústria de TV, a lógica e o bom senso dizem-nos que os players do mercado precisam de estar preparados. A televisão tem de continuar o caminho da sua transformação para se manter relevante. Identificar as tendências emergentes ajudará os profissionais do setor a determinar como ajustar as suas estratégias de media, definir as táticas para obter sucesso e prepararem-se melhor para o futuro.

Neste contexto, também o modelo de negócio deverá ser repensado. A transformação desta indústria, passando de um mundo de economia newtoniana para um mundo de economia quântica, onde duas coisas que parecem estar em oposição podem ser verdadeiras ao mesmo tempo: pode-se ter um grande sucesso na plataforma, mas não se está a fazer nada para aumentar as receitas, é um quebra-cabeças para os especialistas e profissionais do setor.

Vamos continuar a assistir a mudanças revolucionárias na tecnologia da televisão que, sem dúvida, mudará a forma como assistimos ao programas, filmes e jogos favoritos. Mas, duas coisas continuarão a definir a evolução da indústria de TV nos próximos anos: conteúdo (histórias e emoções) e tecnologia, especialmente gaming, realidade virtual/aumentada e inteligência artificial. A conjugação destes elementos irão influenciar o comportamento do utilizador e a proposta de valor para melhor responder aos consumidores.

No final, não nos esqueçamos que o cliente é rei: os utilizadores é que decidem. Quaisquer que sejam as novas plataformas e a diversificação de serviços, a capacidade de descoberta, de visibilidade e de relevância terão necessariamente de se manter para manter a ligação com os públicos/espetadores.