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“Uma tribo tem uma vida feliz e tranquila num remoto deserto algures em África, mas quando uma garrafa de Coca-Cola cai miraculosamente dum avião toda a vida da comunidade se transforma num caos absoluto. O líder da tribo, Xi, decide devolver o estranho objeto aos deuses para restaurar a paz”. E é precisamente aí que tudo se complica. Esta é a sinopse de um celebre filme do início da década de oitenta, “Os deuses devem estar loucos” dirigido por Jamie Uys. Qualquer semelhança com a atualidade será, seguramente, coincidência.
Nas primeiras décadas do século passado, viviam-se períodos de grande incerteza, com vários países a assumirem posições unilaterais e, por essa via, a dificultarem o comércio internacional. Em 1947, é assinado o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) criando-se um importante fórum internacional capaz de impulsionar uma abordagem multilateral, assim como definir um sistema de regras relativas ao comércio reconhecidas à escala internacional. Este acordo histórico seria a gênese da Organização Mundial do Comércio (OMC), constituída em 1995.
Com maior ou menor dificuldade, muitos avanços e alguns, poucos, recuos, a OMC integrou vários acordos comerciais e contribuiu para a normalização das trocas comerciais. Até agora.
Uma das grandes conquistas da OMC passou pela criação de um Órgão de Resolução de Litígios, com a competência para decidir sobre litígios comerciais e permitir que os seus membros, independentemente de seu peso político ou da sua influência económica, apresentassem queixas sobre alegadas violações das regras universais.
A União Europeia já recorreu duas centenas de vezes ao sistema de resolução de litígios da OMC, 110 dos quais como queixosa e 94 como acusada. Noutros 217 casos, solicitou o estatuto de «terceiro», monitorizando litígios entre as partes. Desde 2001, os membros da OMC têm participado numa ampla ronda de negociações comerciais multilaterais, designada «Ronda de Doha» ou «Agenda de Doha para o Desenvolvimento», cujo principal objetivo é colocar o desenvolvimento no centro do sistema de comércio. As conversações de Doha, que procuram conferir aos países em desenvolvimento um papel cada vez mais importante e reforçar a sua capacidade, de forma a beneficiarem do comércio internacional e combaterem a pobreza, encontram-se por concluir. Passaram-se mais de 20 anos.
Aos dias de hoje, o papel da Organização Mundial do Comércio é irrelevante. Ao declarar o Dia da Emergência Nacional, o presidente Donald Trump rejeitou os princípios básicos de um comércio mais justo, mais livre e mais equilibrado.
Verdade seja dita, é a terceira vez que decisões desta natureza são assumidas pelo governo americano. Já antes, em 1828 e em 1930, a Administração Americana tomou resoluções uniliterais muito idênticas a estas. Em média, cada um dessas decisões, demorou quatro anos a ser revertida.
Chegados aqui, é difícil estimar os impactos destas medidas sobre o comércio internacional, em especial no que se refere à queda do consumo e do aumento da inflação nos EUA, que poderão impactar a generalidade das economias mundiais.
Nunca tanto como hoje, importa regressar às mesas das negociações, criando pontes de entendimento que favoreçam a evolução do comércio e, no limite, o progresso da própria sociedade.
No setor do calçado em particular, os principais afetados serão seguramente os consumidores norte-americanos. Atualmente, os “States” são o maior importador mundial de calçado, importando dois mil milhões de pares de calçado todos os anos. No entanto, apenas produzem localmente vinte milhões de pares (cerca de 1% das necessidades). Objetivamente, neste momento a economia americana não tem qualquer condição para produzir uma quantidade relevante do consumo. Se os Deuses não estiverem mesmo loucos, imperará o bom-senso e os americanos não correrão o risco de viver, literalmente, descalços.
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